Agenda Bahia discute hoje destinação correta de resíduos
Um dos grandes desafios da sociedade contemporânea é dar destinação correta aos resíduos. Em sua quarta edição, o Fórum Agenda Bahia vai debater, hoje, o tema Resíduos Sustentáveis, no auditório da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb).
A primeira palestra sobre Economia Verde e Gestão Responsável para a Sustentabilidade será ministrada pelo economista Eduardo Giannetti, das 9h às 10h.
Das 10h às 11h, mediado pelo vice-presidente da Fieb, Irundi Sampaio, ocorre o debate Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS): desafio imediato para Economia Verde. Entre os participantes, Mariana Meirelles (MMA), Dalberto Adulis (Instituto Akatu) e Jorge Soto (Braskem).
Na parte da tarde, das 14h às 14h30, será apresentado um estudo de caso sobre Recuperações de Resíduos Sólidos Urbanos, por Alexandre Citvaras (Grupo Foxx Haztec). Das 14h40 às 17h ocorre o debate Desafios e Oportunidades com o PNRS, com Ricardo Rolim (Ambev), Carlos Silva Filho (Abrelpe) e Cícero Monteiro, secretário estadual de Desenvolvimento Urbano. O debate será mediado por Giacomo Mancini, da Rede Bahia.
Fonte Correio da Bahia
“Os preços têm de conter o custo ambiental”, defende economista Eduardo Gianetti
PhD em Economia pela Universidade de Cambridge, Eduardo Giannetti, palestrante do próximo seminário do Fórum Agenda Bahia, defende um novo sistema de preços que inclua o custo da emissão de carbono. O especialista aponta a Educação como prioritária na transição para uma nova economia
O economista e cientista político Eduardo Giannetti irá abrir o próximo seminário do Fórum Agenda Bahia, tema Resíduos Sólidos, em Desenvolvimento Sustentável. Com a palestra Economia Verde e a Gestão Responsável para a Sustentabilidade, O PhD em Economia pela Universidade de Cambridge defendeu em entrevista ao CORREIO duas ideias principais.
A primeira é a de que a crise ecológica só terá solução definitiva com a adoção de um novo sistema de preço que inclua o custo de emissão de carbono envolvido no processo de produção. A emissão do carbono está na raiz do aquecimento global. A segunda ideia é a de que felicidade e qualidade de vida independem de crescimento econômico. Principalmente se este crescimento for baseado em um modelo ambientalmente predatório.
A crise de 2008 que se perpetua até agora tem, para o senhor, algum componente ecológico?
Acho que tem duas crises. Uma é a crise financeira, causada pelo excesso de criação de ativos financeiros e de crédito que revelou um aspecto de insustentabilidade nos planos das finanças. Mas tem um pano de fundo, que não tem a eloquência da crise financeira mas que é muito mais sério que é a crise da mudança climática. Ela não tem o ritmo alucinante da crise financeira, mas do ponto de vista da espécie humana e do futuro tem dimensão muito mais séria. É pena que a crise financeira tenha desviado a atenção e diminuído investimentos necessários para caminharmos para uma economia ecologicamente mais equilibrada.
É possível unir economia de mercado e ambientalismo?
Esse é um grande desafio. Sabemos que as economias de planejamento central tiveram uma performance desastrosa em relação ao meio ambiente. Mas nós estamos descobrindo agora que a economia de mercado e o sitema de preço também padecem de séria deficiência no tocante ao modo como lidamos com os recursos ambientais porque este sistema não sinaliza o ônus ambiental das nossas escolhas como produtores e consumidores.
O que precisa ser mudado?
Os preços dos produtos têm de conter o custo ambiental. Existem atividades muito onerosoas do ponto de vista ambiental e isso não aparece no custo de produção e nem no preço final ao consumidor. Dou um exemplo: a produção de energia a partir do carvão. Você compara na ponta do lápis e parece que a energia a carvão é mais barata que a solar ou a eólica. É por isso que chineses fazem boa parte de seus investimentos em termoelétricas a carvão. Só que esta comparação é muito desigual pois não contabiliza nos custos a emissão de carbono da produção. Se você atribuir um preço à emissão do carbono que vai prejudicar a questão da mudança climática, muda a equação e a comparação entre as diferentes fontes de geração elétrica. O atual sistema de preços não faz essa contabilidade adequadamente. Outro exemplo: ao viajar de avião, um cidadão cruzando o Atlântico emite mais CO² equivalente que um indiano durante um ano vivendo em meio rural. Só que o passageiro não paga pelo carbono que ele emitiu. Paga pelo equipamento, pelo combustível, pelo serviço, pelo aeroporto, mas não paga pela emissão de carbono, que sai de graça. Esse preço vai ter de mudar. Os preços relativos vão ter de mudar. As coisas muito onerosas ambientalmente vão ter que ficar relativamente mais caras na comparação com as escolhas de produção e consumo que não são onerosas ambientalmente.
O senhor fala em “vai ter que mudar”. Por que um discurso tão fatalista?
Porque é a maneira da humanidade equacionar e conter uma ameça que se torna cada dia mais evidente de aquecimento global. Se isso não vier de maneira coordenada e de correção do sistema de preços vamos assistir grandes catástrofes ambientais que vão exigir soluções autoritárias e impositivas.
É possível que esta mudança aconteça em curto e médio prazos?
Há indícios de que começam a surgir propostas e práticas concretas de correção do sistema de preços. A Austrália faz um trabalho bem interessante de precificação de carbono. Na hora que o carbono for adequadamente precificado as pessoas vão ter incentivos para fazer escolhas que sejam ecologicamente mais adequadas. E os produtores também. O ideal seria que tudo mudasse a partir de um processo de tomada de consciência, mas é muito difícil e lento este processo. Então a solução real e permanente deste problema terá de vir pela correção do sistema de preço.
Há uma crítica no seio do movimento ambientalista em relação ao consumo consciente, que o que o senhor parece defender. Segundo esta crítica, o consumo consciente não resolve, só retarda a solução.
Eu sou totalmente a favor do consumo consciente e da responsabilidade social e acho que as empresas têm de prestar atenção a isso. Mas enquanto economista eu constato que não podemos contar com isso como uma solução permanente. A British Airways, dado que todos estão preocupados com a questão climática, ofereceu aos passageiros a opção de no momento da aquisição do bilhete pagar um adicional pelo carbono emitido no trajeto. Qual foi adesão? 3% dos passageiros. Está todo mundo preocupadíssimo com a mudança climática mas na hora de pôr a mão no bolso ninguém põe.
Talvez porque o custo de vida já esteja tão alto…
Mas estou falando de um país rico, onde as pessoas poderiam arcar com este custo. E terão de arcar em algum momento.
Isso em um país rico, e um país como o Brasil…
O Brasil também vai ter de prestar muita atenção nisto. Se não tivermos uma gestão muito inteligente e responsável de nossos recursos naturais nós vamos destruir a base de geração de riquezas do país e vamos começar a ser discriminados internacionalmente, pois vão começar a impor sanções. O Brasil precisa prestar atenção como a Nova Zelândia está prestando em relação à emissão de carbono pelo rebanho bovino, aviário, suíno.
Que tipo de sanção?
Pode ser protecionismo ambiental. Países que emitem grande quantidade de carbono ou desmatam desmedidamente vão começar a sofrer sanções da comunidade internacional. Há pouco tempo na Europa começaram a colocar etiquetas nos produtos em supermercados dizendo o trajeto que aquele produto percorreu para chegar na gôndola, para o consumidor ficar sabendo. Diante disso, a Nova Zelândia ficou toda mobilizada para informar aos consumidores que, apesar de toda aquela viagem, seus produtos eram ecologicamente mais corretos que os europeus. A sanção vai vir de governos e de consumidores que vão boicotar. E do mercados de capitais. Empresas vão ter dificuldade de encontrar financiamento se não demonstrarem uma contabilidade ambiental equilibrada.
É possível para o Brasil e, especificamente a Bahia, que ainda apresentam índices de tempos pré-industriais, saltar etapas?
É perfeitamente possível e muito desejável.
Como seria a transição? Ela seria imediata ou tem uma agenda de mudanças a ser seguida?
Não tem saltos, revolução ou descontinuidade. É incrementalismo. São pequenas conquistas e pequenas possibilidades que vão se compondo e juntando ao longo do tempo para dar o resultado final.
E a questão da mão de obra nesta nova economia? O setor de serviço absorveria toda mão de obra?
A transição para uma economia de baixo carbono gera muito emprego também. Ela depende muito de inovação e pessoas capacitadas para usarem suas inteligências de modo a agregar valor sem agredir o meio ambiente.
Mas aí o senhor está falando de uma mão de obra altamente qualificada, que não é o caso, por exemplo, da Bahia.
Mas aí temos de caminhar e a educação se torna cada vez mais prioritária para termos uma economia de baixo carbono. Sabemos que a inclusão social gera novos grupos sociais que vão demandar mais serviços e a economia de serviços requer preparo. Estamos falando de educação, saúde, entretenimento. Áreas em que a contribuição da inteligência humana é essencial.
E como o senhor vê a agenda ambiental do governo brasileiro? Quais são os avanços e os retrocessos?
Vejo um retrocesso lamentável no Brasil nos últimos anos. Voltamos a aumentar o desmatamento na Amazônia depois de anos em que consiguimos uma redução consistente. O código florestal gerou muita insegurança jurídica e situações indefinidas e voltamos a assistir práticas predatórias do meio ambiente. Na geração energética, o governo volta a falar em termoelétrica a carvão. E nenhuma palavra em energia solar. Um tremendo retrocesso.
O lixo também já é usado para geração de energia. O que o senhor acha da Política Nacional de Resídos Sólidos?
A reciclagem do lixo e a transformação do lixo em energia é um caminho muito bem vindo. Acho que pequenos municípios vão ter dificuldades de se adequar mas aí cabe um esforço de treinamento para que eles tenham condições de obter os recursos e possam fazer aquilo que é previsto pela nova lei em termos de tratamento responsável do lixo e dos resíduos sólidos.
A gente tem falado muito no papel do governo. E as entidades privadas, com têm se comportado na questão ambiental no Brasil?
Há muita heterogeneidade no setor privado. Existe um setor privado muito responsável e atento às questões do meio ambiente. Mas há também um setor empresarial no Brasil que infelizmente não está a altura do desafio e do nível de exigência do século XXI.
Um ponto central de seu pensamento, professor, é a questão da felicidade. O que o senhor sugeriria em termos de esforços de governos e empresários para que a felicidade esteja ao alcance de todos?
O primeiro passo é não acreditar que o crescimento econômico é um fim em si mesmo. O aumento da renda é um meio para se viver melhor. A partir de um certo nível não existe qualquer evidência de que ganho de renda per capita se traduza em ganho de bem estar humano. Um país como o Brasil não precisa almejar um padrão de renda de um EUA ou uma Alemanha. Agora, a gente tem de resolver problemas muitos elementres da vida que ainda não foram resolvidos. Me chama muita atenção o fato de em pleno século XXI quase metade dos domicílios brasileiros não terem saneamento básico. Isso é intolerável. Isso me preocupa muito mais que o nível de renda per capita do brasileiro não ser igual ao americano, europeu ou japonês. A educação fundamental, embora universalizada, não atende requisítos mínimos de qualidade para capacitar o indivíduo para ter uma vida formada e produtiva. Temos de dar a capacitação para a pessoa ser feliz, que é a gramática. Temos de dar a gramática, que é o conhecimento de como falar e escrever, mas o texto cada um faz o seu.
Fonte: Correio da Bahia
Flávio Oliveira
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